Oito poemas de Aleksandr Blok

Considerado por Górki o maior poeta russo de seu tempo, Blok criou imagens e versos que marcaram a literatura de sua nação como poucos. Na tradução de Rafael Frate, oito de seus poemas.

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Considerado por Maxim Górki o maior poeta russo de seu tempo, Aleksandr Blok (1880–1921) criou imagens e versos que marcaram a literatura de sua nação como poucos. Comparado a Pushkin, foi celebrado em versos por Anna Akhmátova, Marina Tsvetaeva e Boris Pasternak. No Estado da Arte, na tradução de Rafael Frate, recuperamos oito de seus poemas.

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Aleksandr Blok por Anatoly Shumkin

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Que brilhe agora a lua — a noite é escura.
Que a vida dê a todos a alegria —
O amor da primavera não é cura
Pra alma em tormentosa ventania.

A noite se estendeu à minha frente
E responde com seu olhar de morte
A este opaco olhar de alma doente
Banhado num veneno doce e forte.

E, encobrindo em vão o ardente fogo,
Na treva da gelada madrugada
Em meio à multidão, sozinho eu vago
Com apenas uma ideia ainda velada:

Que brilhe agora a lua — a noite é escura.
Que a vida dê a todos a alegria —
O amor da primavera não é cura
Para alma em tormentosa ventania.

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Janeiro, 1898. S. Petersburgo.

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K.M.S.

A lua deixa o leito. Trovejando
A cidade derrama fogos vários.
Aqui tudo é tão calmo, lá insano;
Lá tudo é brilho — e nós, tão solitários.
Mas se a chama do encontro que se cala
Fosse uma chama eterna para nós,
Não correria assim a tua fala,
Não soaria assim a nossa voz.
Acaso uma paixão ainda nos prende,
E há ainda alegria a se sentir?
Na hora do encontro indiferente
Lembramos a tristeza do partir.

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14 de dezembro de 1898

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Eu pressinto a tua presença. O tempo passa implacável —
Tudo apenas numa imagem, eu pressinto tua presença.

O horizonte todo em chamas — e a luz é insuportável,
E calado aguardo agora, na dor de amar tão intensa.

O horizonte todo em chamas e é tão breve a aparição,
Mas sou servo do receio: mudarás a tua imagem,

E uma idéia insolente incitas em meu coração
Trocando afinal seus caros traços por outra miragem.

Eis a minha perdição — tão triste tão rebaixado,
Sem poder vencer o anseio pela última paragem.

Como é claro o horizonte! E o brilho está a meu lado,
Mas sou servo do receio: mudarás a tua imagem.

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4 de junho de 1901. Chakhmátovo.

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Agora, pleno de beatitude,
Diante da morada abençoada
Aguardo o anjo belo em plenitude;
Portando a espada bem-anunciada.

Agora piedade, ó meu Deus,
Piedade desse seu bendito escravo
Traz-me de volta o anjo, Santo Deus,
Com as asas imponentes e tão alvo!

Meu Deus! Meu Deus!
Ah, creia nessa minha oração,
Minha alma se consome dentro dela!
E tire desta horrível condição
Esse escravo extenuado!

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15 de fevereiro de 1901

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Ruas e ruas.
Sombras silentes se apressam
Ao corpo vender
E comprar o esquecer
E mais uma vez submergir
Nas águas modorrentas da metrópole — gelado invernal…
Dorme, esquece as palavras radiantes.
Ah, se não fossem essas pequenas
Flores cintilando nas janelas!
Cortinas e florezinhas escarlates!
Faces inclinando-se a um paupérrimo trabalho!
Silêncio.
A lua apareceu,
E as fileiras de plumas nubladas
Dispersam-se distantes.

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Janeiro de 1905

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Eco

Ao vale verdejante, a clamar, a louvar,
sigo pela folhagem farfalhante,
e a lua fria aguarda alta sem queimar,
tal foice verde no azul que a abrange.
Rendado de folhas
Dourado outonal
Eu chamo e três vezes
De longe, bem alto
Responde-me a ninfa, responde-me Eco
Como se fora no campo do ocaso dourado,
Sempre fugindo do deus que é criança,
Tão cheia de riso…
Lá, o deus a pegou, entrega-se Eco
E em cálidos giros é doce sua queda,
E o riso ao longe
Ressoa de novo
Sob o céu inocente…
E o amor e a morte,
E a morte e o amor,
São ramos casados
De adornos do outono e abraços…
Lá, na imensidão azul, minha voz prevê
Retornar, revirar todo o mundo para mim!
Mas, brilhando nas asas da noite a correr,
À lânguida flauta de um dia no fim,
Gargalha a Ninfa ao desaparecer.

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Da neblina cristalina,
De algum sonho inesperado,
Certo rosto peregrino,
Numa sala de cantina
Pelo vinho engarrafado.

Gane a música cigana
Vinda da sala afastada
Grito cinza de violino…
Sopra o vento, sopra a dama
Na voragem espelhada.

Olho no olho, e, azul-queimante,
Destacou-se o amplo céu.
Madalena, Madalena!
Sopra o vento lá, distante
Dando ar ao fogaréu.

Copo estreito. Tempestade
Além do surdo vitral.
Foi-se meia vida apenas!
Mas, além, a claridade
Bronzeando a terra austral.

A licença dos tormentos
Do elogio e da perfídia
De cada riso silvante,
De encurvados movimentos —
Tal meu copo, estoure a vida!

Para que na noite que mente
Não reste de paixão forte
Para que, no violino uivante,
Esse par de olhos fremente
Caia com o ocaso da morte.

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6 de outubro de 1909

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Nas Dunas

Não gosto deste léxico vazio
De expressões de amor e lastimosos
Ditos: seu; minha; amo; sempre tua.
Não quero a escravidão. Com o olhar livre
Encaro os olhos da mulher bonita
E digo: hoje à noite. E amanhã,
Brilhando, chega um novo dia. Vem,
Toma posse de mim, paixão solene
Que amanhã vou-me embora a cantar.
A minha alma é simples: o aroma
De âmbar e a maresia a nutriram
E eles têm em si todos os traços
Que trago no meu rosto fustigado.
E eu sou lindo. Tenho a chã beleza
Das dunas e dos mares lá do norte.
Assim pensava eu pela fronteira
Da Finlândia, escutando os murmúrios
Dos finos não rapados de olhos verdes.
Caiu o silêncio. E na plataforma
O trem já dispersava sua fumaça
E a preguiçosa guarda alfandegária
Da Rússia descasava no declive
Arenoso que era o fim dos trilhos.
Ali um país novo começava
E algum desabrigado templo russo
Olhava o outro país desconhecido.
Assim pensava eu, e eis que ela chega
E me espera na encosta. Eram ruivos
Seus olhos pelo sol e pela areia.
E os cabelos de tronco de pinheiro
Caíam azulados por seus ombros.
Chegou. Cruzou o seu olhar de fera
Com meu olhar feral. Soltou sonora
Gargalhada. Depois jogou em mim
Torrões, tufos de grama e um punhado
De areia cor de ouro. De repente,
Saltou, desembestando morro abaixo.
Por um bom tempo a segui. Rasguei
O rosto nas agulhas dos pinheiros,
Tingi de sangue as roupas. Como fera
A persegui urrando sem parar,
E a louca voz lembrava a de um berrante.
Ela deixava as marcas passageiras
Nas dunas e acabou no pinheiral
Quando o azul da noite a entrelaçou.
E agora deito só e me recobro
No areal. Os olhos fulgurantes
Ainda a veem correr e gargalhar:
Gargalham os cabelos, suas pernas,
Gargalha a roupa, inflada na corrida…
E eu deito e penso: “sim, é hoje à noite,
E amanhã também. Daqui não saio
Enquanto não a acosso como fera
E com a voz sonora de berrante
Não barro seu caminho e não digo:
Minha, só minha. — e deixe que ela grite:
Tua, apenas tua.

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Liubóv e Aleksandr Blok

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