Entrevista com Agnaldo Portugal, Fabio Bertato e Roberto Covolan. Por Marcelo Consentino.
Rádio Estado da Arte.
Na mesma época em que o louco da parábola de Nietzsche proclamava que “Deus está morto”, o filósofo russo Vladimir Soloviov era indagado após uma conferência: “— Mas o senhor acredita realmente em Deus?” “— Senhor, eu só acredito em Deus”, respondeu, sugerindo que só um ser supremo absolutamente bom é digno da nossa absoluta confiança.
Hoje, pelo menos 90% da população mundial se diz religiosa ou espiritualizada, 70% acredita na existência de Deus. Mas podem prová-la? Entre os profissionais da argumentação racional, os filósofos acadêmicos, estima-se que 7 em 10 sejam descrentes. Com boas razões: as ciências parecem explicar a mecânica do universo sem necessidade de Deus; um ateu pode ser tão razoável e decente quanto o melhor dos crentes, e mesmo profundamente religioso e até santo, como alguns budistas. De resto, como Deus pode tolerar o mal, o sofrimento de crianças inocentes, para não falar da crueldade eterna do inferno? Na pior das hipóteses, as religiões parecem ser tiranias obscurantistas adoradoras de um ditador cósmico; na melhor, o conforto de um placebo superlativo — em todo caso, uma ilusão sem futuro.
Por outro lado, se nada no universo vem do nada, como o próprio universo pode vir do nada? Que da matéria bruta surjam seres vivos, capazes de amar e se reproduzir; ou que da brutalidade e inocência do mundo animal surjam mentes racionais, capazes de compreender o universo e agir com suprema magnanimidade — mas também com perversidade destrutiva —, mesmo para com todas as criaturas, parecem eventos tão improváveis que só podem ser definidos como um mistério, quando não um milagre. E de onde viria o nosso apetite pela beleza infinita, senão de um ser infinitamente belo? Ainda que as leis morais pareçam infinitamente variáveis, de onde viria a intuição universal de uma lei moral, senão de um supremo legislador? E que dizer da experiência pessoal da maioria da humanidade hoje e em todos os tempos? O testemunho de filósofos como Confúcio, Platão, Aristóteles, Descartes ou Kant; de cientistas como Galileu, Newton ou Einstein; de artistas como Michelangelo, Bach, Dostoievski; ou de profetas, como Moisés e Maomé, para não falar do chamado Filho de Deus e sua mãe, não será, senão uma “prova” racional da existência de Deus, um indício de que a crença nele é perfeitamente razoável? E não será possível, como disse Pascal, que Deus queira aparecer abertamente àqueles que o buscam com todo o coração, e se esconder daqueles que o evitam com todo o coração?
Entre tantas incertezas, uma coisa é certa: a questão sobre a existência de Deus é aquela sobre a qual não se pode conceber nenhuma maior. Afinal, a resposta é a única que muda, bastante literalmente, tudo.
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Convidados
Agnaldo Portugal: professor de filosofia da religião e filosofia da ciência da Universidade de Brasília.
Fabio Bertato: pesquisador do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência da Unicamp.
Roberto Covolan: vice-presidente da Associação Brasileira de Cristãos na Ciência.
Apresentação: Marcelo Consentino
Produção técnica: Compasso Coolab.
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