Segurança internacional na era nuclear

Um sistema de segurança internacional que dependa de armas de destruição em massa não poderá ser universal nem duradouro. Um ensaio do embaixador Sérgio Duarte sobre os desafios e oportunidades da segurança internacional na era nuclear.

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Segurança internacional na era nuclear: desafios e oportunidades

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por Sérgio Duarte

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Farão de suas espadas arados,

e de suas lanças, foices. As nações

não mais erguerão suas armas contra

 outras nações, e jamais tornarão

 a preparar-se para a guerra.

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Isaías, 2: 3-4

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Edifício das Nações Unidas em Nova York

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Um pouco de História

As palavras do Livro de Isaías citadas na epígrafe datam do século VIII A.C. e revelam a profunda e antiga preocupação da humanidade com o desarmamento como condição para a paz.

Apesar do tom otimista da profecia, na verdade durante muitos séculos as nações vêm erguendo armas cada vez mais mortíferas umas contra as outras e não deixaram de aprender e aperfeiçoar as artes da guerra. A busca de segurança por meio da superioridade militar tem influenciado o comportamento de governantes, nações povos desde tempos remotos.

O sistema feudal que prevaleceu na Europa nos primeiros séculos da Idade Média não exigia o recrutamento e manutenção permanente de exércitos numerosos. Aos poucos, porém, o treinamento de forças armadas e a produção e fornecimento de equipamento passaram a ser uma necessidade que somente reinos mais ricos poderiam sustentar. A guerra se transformou em uma profissão especializada e a vitória se tornou cada vez mais dependente de melhorias tecnológicas do armamento e do desenvolvimento de técnicas de batalha.

Em 1648, os tratados de Münster e Osnabrück, conhecidos como a Paz da Vestfália[1], interromperam guerras constantes entre os diversos reinos e principados europeus e lançaram as bases dos modernos Estados-nação. Durante os três séculos seguintes as relações entre os Estados se tornaram cada vez mais complexas e o direito internacional foi continuamente reformulado e adaptado a fim de acomodar as mudanças nas realidades estratégicas e as diferentes percepções de segurança.

No século XVIII filósofos e estadistas procuraram definir formas de preservar a segurança e manter a paz por meio de esforços cooperativos. O Abade St. Pierre propôs um “projeto de paz perpétua na Europa” e Jean-Jacques Rousseau também tratou do assunto em suas obras. Em 1795 Immanuel Kant apresentou as bases filosóficas[2] de um conjunto de medidas destinadas a assegurar a paz. Em sua opinião, a humanidade tinha o dever de transformar em realidade o ideal de uma comunidade universal de seres humanos sob o império da lei. A noção de segurança coletiva por meio do equilíbrio de poder, cooperação militar contra ameaças externas e aceitação de padrões comuns de conduta encontrou apoio entre os governantes dos diversos reinos e principados soberanos.

Poucas décadas depois, as ideias dos filósofos do Iluminismo deram alento à burguesia e às massas urbanas e rurais para rebelar-se contra a nobreza em sangrentos levantes. O surgimento de sentimentos nacionalistas e em alguns casos a influência e poder das forças armadas geraram guerras de independência e/ou unificação na Europa e nas Américas.

Após a derrota de Napoleão o Congresso de Viena[3] reorganizou a estrutura política do continente. Inevitavelmente, eclodiu novo conflito, agora entre a unificada Alemanha e a França pós-napoleônica, em 1870-71.

Restaurada a paz, duas conferências realizadas na Haia, em 1899 e 1904 buscaram reforçar a segurança mediante acordos sobre diversos aspectos do direito dos conflitos.

Embora sem conseguir obter consenso sobre reduções, esses conclaves instituíram certas limitações aplicáveis a armamentos e adotaram normas de cunho humanitário, além de estabelecer o princípio da igualdade soberana dos Estados[4]. O crescimento do militarismo, as rivalidades regionais e ressentimentos decorrentes de guerras anteriores foram fatores importantes da Primeira Guerra Mundial em 1914-18. O Tratado de Versalhes, que entrou em vigor em 1920, trouxe o fim daquela conflagração, com importantes consequências geopolíticas e no campo do direito internacional, inclusive na esfera humanitária.

Ao fim do conflito, foi fundada uma organização multilateral que visava a manutenção da paz — a Liga das Nações[5]. As feridas da guerra, porém, não estavam ainda cicatrizadas. Nova guerra mundial eclodiu em 1939, devastando a Europa e afetando grande parte do resto do mundo. Surgiram novos tipos de armamento, inclusive submarinos, extensos bombardeios aéreos e já no final das hostilidades os primeiros foguetes carregados com explosivos convencionais.

Juntas, a primeira e a segunda guerras mundiais mataram direta ou indiretamente cerca de 120 milhões de pessoas, principalmente na Europa, Japão e ilhas do Pacífico. Provavelmente jamais se saberá o número exato de vítimas nas áreas coloniais e menos desenvolvidas do planeta.

Após a derrota da Alemanha nazista e do Japão imperial em 1945 a aliança militar entre os Estados Unidos e a União Soviética se desfez, dando lugar a um período de reorganização das estruturas internacionais de poder. Ideologias opostas dividiram o Ocidente e o Oriente europeu em dois blocos rivais liderados respectivamente pelos EUA e pela URSS. Aos poucos o processo de descolonização criou novas nações independentes na África, Oriente Médio e Ásia.

O intervalo entre o fim da Segunda Guerra e a dissolução da. União Soviética em 1989 ficou conhecido como “Guerra Fria”.

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Salle de la Reformation: Abertura oficial da Liga das Nações, 1920

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As Nações Unidas

A fundação das Nações Unidas em 1945 substituiu a malograda Liga das Nações e deu expressão política e jurídica à determinação dos povos de todo o mundo de “salvar as futuras gerações do flagelo da guerra”[6]. Embora não tenha havido desde então nova conflagração entre as principais potências, inúmeros conflitos locais, muitas vezes provocados ou instigados por elas, eclodiram no restante do mundo.

Ao mesmo tempo, porém, a comunidade internacional tem procurado realizar os objetivos definidos pelos Propósitos e Princípios da Carta da ONU. Ao longo de seus 75 anos de existência a organização evoluiu, transformando-se em um complexo sistema que além da estrutura original compreende hoje diversas agências, programas e instrumentos para a realização de objetivos específicos. A ONU desempenha importante papel na definição, codificação e expansão do âmbito do direito internacional.

A Carta instituiu um arcabouço jurídico baseado na igualdade soberana das nações, no cumprimento de boa-fé das obrigações assumidas, na solução das controvérsias por meios pacíficos e na abstenção do uso ou ameaça de uso da força. O respeito a esses princípios por toda a comunidade internacional é essencial para a manutenção da paz e segurança. Em sua ausência, as relações internacionais seriam completamente dominadas pela autoridade arbitrária dos mais fortes.

Nas décadas recentes novos atores e novas preocupações adquiriram preeminência no cenário internacional enquanto surgiam e se consolidavam novos polos de poder. Temas como a mudança do clima, e a proteção do meio ambiente, a existência e proliferação de armas de destruição em massa, a insegurança alimentar, as desigualdades econômicas e sociais, os direitos das minorias, os movimentos de populações, o terrorismo sectário e outras questões suscitaram a necessidade de desenvolver instrumentos comuns para seu tratamento.  Por serem até certo ponto interconectados e afetarem a toda a comunidade internacional, esses temas têm sido considerados “globais”. O aumento exponencial da velocidade e alcance das comunicações e transportes e do relacionamento interpessoal em todo o planeta criou a necessidade de tratá-los de forma multilateral, holística e consensual a fim de satisfazer os múltiplos e às vezes divergentes interesses envolvidos.

No entanto, o direito internacional se mostrou incapaz de tratar de maneira eficaz grande número de questões relativas à segurança, como o desarmamento nuclear e a proliferação de armas de destruição em massa em todas as suas dimensões, inclusive a possibilidade de seu uso. Outros temas prementes além dos mencionados acima, ainda não se encontram adequadamente atendidos pelas normas internacionais em vigor. Apesar dos importantes progressos em muitos campos, o aumento do nacionalismo mal orientado e da tendência ao isolacionismo e excessiva confiança no poderio das armas fizeram com que a definição e prática do direito internacional se tornassem cada vez mais dependentes das decisões dos poderosos na busca de estabilidade e segurança. Em alguns casos, países fortemente armados recorreram à força militar ou a outros meios de pressão e intimidação para resolver situações específicas conforme seus interesses, sem autorização do Conselho de Segurança da ONU nos termos da Carta.

Potências externas frequentemente intervêm em tais situações, exacerbando tensões oriundas de aspirações locais, ressentimentos antigos e divergências étnicas ou religiosas, aumentando o risco de escalada e de fricções mais amplas. Tecnologias avançadas permitem a esses países participar de tais conflitos à distância, minimizando ou evitando suas perdas materiais e humanas a fim de obviar críticas e objeções domésticas.

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Assembleia-Geral da ONU, 1988

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O advento da arma nuclear

A Carta das Nações Unidas foi adotada em 26 de junho de 1945, praticamente três semanas antes da primeira detonação atômica experimental realizada pelos Estados Unidos no deserto do Nevada. Por esse motivo, a Carta não contém qualquer menção ao armamento nuclear.  No entanto, a primeira resolução aprovada pela Assembleia Geral em janeiro do ano seguinte determinou a constituição de uma Comissão para “tratar do problema gerado pela descoberta da energia nuclear” e fazer propostas para a eliminação das armas atômicas.[7] Devido à hostilidade entre as duas principais potências, a Comissão não produziu resultados. Até hoje, 75 anos depois, a comunidade internacional não conseguiu chegar a consenso sobre medidas juridicamente vinculantes, irreversíveis e independentemente verificáveis de desarmamento nuclear.

As Nações Unidas procuraram também obter progressos na regulamentação dos armamentos convencionais, que englobam, entre outros, as munições, as armas leves e de pequeno porte, artilharia pesada, veículos blindados, helicópteros e aeronaves de combate, minas terrestres e munições “em cacho”.  Diversos acordos foram negociados e adotados a fim de regulamentar esses meios de combate e aumentar a confiança entre os países para minimizar os riscos de conflito. Nos tempos atuais, entretanto, os avanços tecnológicos têm contribuído para obscurecer as diferenças entre as armas convencionais e as de destruição em massa.

A arma mais cruel e de efeitos mais indiscriminados jamais inventada — a arma nuclear — começou a proliferar a partir de junho de 1945. Poucas semanas depois, a nova arma foi usada para atacar Hiroshima e Nagasaki, matando instantaneamente 150.000 homens, mulheres e crianças nas duas cidades. Muitas pessoas mais sofreram a consequências danosas durante os meses e anos seguintes. Em pouco tempo, vários outros países obtiveram também seu próprio arsenal atômico.

Há consenso geral de que os efeitos catastróficos de qualquer detonação nuclear seriam de ampla escala e potencialmente irreversíveis. Enquanto existirem armas nucleares persistirá a possibilidade de seu uso, com riscos inaceitáveis para a humanidade como um todo. Um corolário lógico dessa afirmação é que existirá também a necessidade de sua completa eliminação.

O general norte-americano Lee Butler, ex-comandante das forças nucleares de seu país, declarou em uma entrevista em 2015 que o mundo havia sido poupado de absoluta devastação por “uma combinação de competência, sorte e intervenção divina — esta última provavelmente na maior proporção”[8].

Diante da incapacidade de encontrar maneiras viáveis de eliminar essas armas, a comunidade internacional passou a preocupar-se com os perigos de sua proliferação

A partir de meados dos anos 1950 uma série de medidas culminaram no debate de um projeto de um tratado de não proliferação de Armas Nucleares que, entrou em vigor em 1970 e é conhecido pela sigla TNP. Em 1995 sua vigência foi estendida indefinidamente e hoje esse tratado é considerado a pedra angular do regime de não proliferação.  Todos os membros da ONU são parte do TNP, com exceção de Israel, Índia Paquistão e República Popular da Coreia.

O TNP dividiu o mundo entre Estados possuidores e não possuidores de amas nucleares. Segundo o Tratado, os possuidores são China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia — isto é, os mesmos que são membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, com poder de veto.

No entanto, após 50 anos, permanecem dúvidas sobre a eficácia do TNP para a promoção do desarmamento nuclear. Os possuidores de armas atômicas não demonstraram de forma convincente seu compromisso com o desarmamento, suscitando intensa frustração e uma crise de confiança nas promessas de eliminação do armamento nuclear contidas no artigo VI do instrumento.

Apesar de reduções e limitações mediante acordos bilaterais e decisões unilaterais adotadas ao longo do tempo, a corrida armamentista prossegue, especialmente em sua dimensão tecnológica.

Outros tratados multilaterais foram também importantes para reduzir ou dificultar a proliferação de armas nucleares, especialmente o Tratado Abrangente de Proibição de Ensaios Nucleares (CTBT),[9] de 1996, a instituição de zonas livres de armas nucleares na Antártica, no espaço exterior e nos fundos marinhos,  na América Latina e Caribe, África, Sudeste asiático, Pacífico Sul, Ásia Central e Mongólia.

Dois instrumentos multilaterais foram negociados e adotados com o objetivo de banir e eliminar as outras duas categorias de armas de destruição em massa: a Convenção de Proibição e Armas bacteriológicas) (Biológicas) e sua destruição e a Convenção de Proibição de Armas Químicas e sua destruição. Estima-se que mais de 95% das armas químicas existentes no mundo foram já eliminadas por força desse último instrumento.

Em 2017 um grupo de 122 países, inclusive o Brasil, promoveu a negociação e adoção, com importante apoio da sociedade civil, de um tratado de proibição de armas nucleares e sua eliminação (TPAN), que entrou em vigor em 22 de janeiro último. Os possuidores de armas nucleares movem intensa campanha contra esse instrumento, que consideram “prematuro” e ineficaz. Até o momento o TPAN conta com 86 signatários, dos quais 54 já o ratificaram.

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‘Fat Man’

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Direito internacional humanitário

Ainda em 1868 a Convenção de S. Petersburgo proibiu o uso de projéteis de peso superior a 400 gramas. As quatro Convenções de Genebra, de 1949, sobre tratamento de soldados feridos, náufragos militares, prisioneiros de guerra e proteção de civis são consideradas universalmente válidas.

Em 1907 foram adotadas diversas convenções sobre a conduta dos Estados em tempo de guerra. O Protocolo de Genebra, de 1925, proibiu o uso de gases asfixiantes e venenosos e deu origem ao esforço que culminou com a adoção da Convenção de Proibição de Armas Químicas e sua destruição. Uma Convenção que baniu o uso de certas armas convencionais de efeitos excessivamente danosos ou indiscriminados foi adotada em 1984.  Mais recentemente, as minas terrestres e as chamadas munições “em cacho” foram objeto de proibição em convenções internacionais humanitárias. Finalmente, o Tratado de Proibição de Armas Nucleares (TPAN), acima mencionado, obriga seus membros a prestar assistência adequada a indivíduos afetados pelo uso ou experimentos com armas nucleares e a remediar danos ambientais nas áreas de ensaios atômicos.

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Segurança internacional no mundo de hoje

A segurança continua a ser uma das principais preocupações tanto de indivíduos quanto de nações. A busca de segurança tem servido para justificar muitos dos conflitos que a humanidade conheceu ao longo dos séculos devido aos esforços para obter supremacia militar assim como por meio de intimidação e às vezes agressão, em vez de arranjos coletivos em prol do fortalecimento da paz e da cooperação. Pode-se afirmar que nenhuma nação estará segura enquanto todas não se sentirem seguras.

As perspectivas dos tempos correntes em matéria de segurança internacional são especialmente preocupantes. A instabilidade, a imprevisibilidade, a rápida inovação tecnológica e as mudanças no posicionamento estratégico das grandes potências se tornaram características definidoras do século XXI. A inobservância de compromissos internacionais assumidos parece crescente e diversas crises eclodiram no passado recente, ameaçando escalar para uma confrontação militar aberta. Um precário equilíbrio baseado na posse e acumulação de armas e sistemas de destruição em massa caracteriza o atual estado de coisas no mundo. Em certo momento durante a Guerra Fria o número de ogivas nucleares em mãos dos nove países possuidores[10] chegou a aproximadamente 70.000. Paradoxalmente, enquanto essas quantidades declinaram ao total hoje existente de cerca de 14.000, a segurança parece mais esquiva do que nunca. Tensões decorrentes de escassez de alimentos e água potável e entre locais de origem, trânsito e destino de grandes movimentos de populações, graves desigualdades sociais e econômicas, além de temores de crises ambientais são fatores potenciais de insegurança e instabilidade. Acadêmicos debatem se a ordem internacional posterior à Segunda Guerra Mundial se encontra em processo de erosão ou se já se tornou definitivamente ultrapassada e com ela a arquitetura de tratados e acordos no campo do desarmamento laboriosamente construída ao longo dos últimos séculos.  Ainda não é possível aquilatar devidamente o impacto da pandemia do Coronavírus sobre as relações internacionais, mas certamente serão necessárias providências multilaterais para fortalecer a segurança sanitária no mundo. A emergência criada pela pandemia traz a perturbadora possibilidade de uma recuperação econômica lenta e desigual.

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 Conclusão

A ênfase no poderio militar e a busca de novos e mais mortíferos meios de destruição, aliadas ao estado de confusão e descrédito dos esforços multilaterais de progresso no campo do desarmamento e controle de armamentos são prejudiciais para a manutenção da paz e segurança internacionais. No passado recente surgiram dúvidas em diversos setores de opinião a respeito da necessidade e valor da abordagem multilateral aos desafios dos tempos correntes. Alguns líderes expressam falta fundamental de confiança nas soluções globais e exaltam a primazia de seus próprios interesses acima dos da comunidade internacional como um todo.

Em consequência, a credibilidade das instituições e instrumentos internacionais existentes se vê fortemente abalada.

As tendências negativas decorrentes dessa situação podem ser assim resumidas: aparente incapacidade — ou falta de vontade política — dos estados mais armados para superar a deterioração de suas relações mútuas em prol de atitudes mais construtivas; sinais de crescente competição entre os Estados Unidos e a China em busca de hegemonia nos oceanos Pacífico e Índico; recrudescimento da corrida armamentista entre as demais potências; desenvolvimento de novas tecnologias ofensivas e ressurgimento de rivalidades regionais em várias partes do mundo; lentidão e divergências no tratamento da deterioração do meio ambiente; menor atenção a questões como o agravamento da desigualdade econômica e social.  A dependência em doutrinas de dissuasão baseadas no uso de armas nucleares e na sobrevivência de capacidade de retaliação a um primeiro ataque aumenta o risco de devastação catastrófica de ambos os beligerantes e do restante do mundo

Torna-se urgentemente necessária a construção de um novo paradigma de segurança que não dependa da posse e uso de armas de destruição em massa. Essa tarefa exige compreensão, comedimento e comportamento racional por parte dos líderes e constante estímulo da sociedade civil em todo o mundo. O progresso no sentido de um clima menos contencioso e de maior colaboração estimularia a comunidade internacional a promover e apoiar novos acordos nos foros multilaterais adequados. Um paradigma eficaz de segurança terá de ser não discriminatório e inclusivo, a fim de proporcionar garantias confiáveis para todos e não apenas para poucos.

As condições necessárias para essa evolução são bem conhecidas: adesão incondicional às normas e princípios de direito internacional, respeito pelos padrões de conduta geralmente aceitos e cumprimento de boa-fé dos compromissos assumidos. Os países possuidores de armas nucleares são primordialmente responsáveis pelo progresso nessa direção, que é do interesse de todos.

Um sistema de segurança internacional que dependa de armas de destruição em massa não poderá ser universal nem duradouro. Paz e segurança são bens públicos que pertencem à humanidade como um todo.

A experiência do passado trouxe lições importantes que precisam ser seguidas. A estabilidade e a segurança não podem ser alcançadas por meio de práticas egocêntricas e isolacionistas que visam apenas a satisfação de interesses paroquiais em detrimento dos interesses mais amplos da humanidade.

A opinião pública tem um papel essencial a desempenhar nesse particular. Os meios de informação, assim como as instituições dedicadas ao estudo de temas internacionais são atores indispensáveis na busca do fortalecimento da segurança de todos.

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Oxford, 1980

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Notas:

[1] Essa designação compreende diversos tratados de paz assinados nas cidades de Münster e Osnabrük entre maio e outubro de 1648, dando fim a guerras religiosas e dinásticas conhecidas como “Guerra dos Cem Anos” e “Guerra dos Trinta Anos”.

[2] Em “Paz perpétua: um ensaio filosófic.o” (1795) Immanuel Kant descreveu um programa de paz a ser implementado pelos governos como base sobre a qual a paz permanente poderia ser construída.

[3] O Congresso de Viena (1814-15) restaurou algumas das fronteiras europeias pré-napoleôncas e produziu um período de relativa paz que durou até a guerra franco-prussiana em 1870 e estendeu-se até a Primeira Guerra Mundial.

[4] As duas Conferências da Haia produziram diversas declaraçoes convenções pioneiras sobre o direito dos conflitos e direito humanitário e crimes de guerra, além de limitações de armamentos e arbitragem internacional. Ao delegado brasileiro Rui Babosa teve papel importante na proposta e defesa do princípio da igualdade soberana, que acabou aceito e consagrado até nossos dias.

[5] A Liga das Nações, fundada em 1919, objetivava o desarmamento, a segurança coletiva, a solução pacífica de controvérsias e a melhoria das condições de vida. Não conseguiu realizar seus elevados propósitos e não foi capaz de impedir a Segunda Guerra Mundial. A Liga foi oficialmente substituída pela Organização das Nações Unidas em   1946.

[6] Preâmbulo da Carta das Nações Unidas.

[7] Resolução n. 1, de janeiro de 1946.

[8] Entrevista com  Robert Kazel , 27 de maio de 2015 (www.wagingpeace.org/general-lee-butler)

[9] O CTBT anda não entrou em vigor devido à falta de assinatura e/ou ratificação por alguns Estados-chave. Mesmo assim, criou uma poderosa norma informal que vem sendo seguida desde a última década do século passado por todos os estados nucleares, menos a RPDC, que realizou seu último ensaio em 2006.

[10] China, Estados Unidos França, Israel, índia, Paquistão, Reino Unido, Rússia e RPDC (Coreia do Norte). Israel não confirma nem desmente oficialmente a posse de armamento nuclear.

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