por Rodolpho Bernabel
A escolha de ministros para o Supremo Tribunal Federal, via de regra, gera polêmica. A questão que sempre se levanta é se a pessoa indicada tem perfil técnico ou político. Essa é, contudo, uma dicotomia ruim para analisar tal situação. O STF é fundamentalmente um órgão político, as instituições que o formam são instituições políticas, o presidente da república é, por definição, um político, assim como os senadores que aprovam ou rejeitam a nomeação. Assim, todas as nomeações para o STF são intrinsecamente políticas. Vale notar que, teoricamente, o escolhido para o STF terá representatividade política, e uma representatividade majoritária da população. Mas na prática quase ninguém se pergunta, na hora de escolher um senador, que tipo de juiz este aprovará.
As exigências constitucionais para que alguém se torne ministro do STF são poucas: ter entre trinta e cinco e sessenta e cinco anos de idade, notável saber jurídico e reputação ilibada, ser nomeado pelo presidente da república e aprovado pela maioria absoluta do Senado Federal, ou seja, quarenta e um senadores. Note-se que, estritamente, nem mesmo é preciso que a pessoa tenha formação oficial em direito. Um autodidata ou simplesmente alguém que aprendeu com alguém pode muito bem obter notável saber jurídico. Assim, a Constituição não nos equipara com uma regra que nos auxilie a filtrar os candidatos ao STF de maneira que estes tenham um perfil mais “técnico”. Não vou nem discutir a regra da reputação ilibada. qual é a medida de pureza de uma reputação? quem mede? A lei não nos dá um instrumento prático para seu uso. É apenas mais uma quimera legislativa, como tantas outras que incham nossa constituição. A intenção do legislador pode ter sido boa, mas o produto entregue não foi.
Uma alternativa às nomeações presidenciais e aprovações parlamentares seria o estabelecimento de um concurso público para o cargo de ministro do STF. Assim, nos aproximaríamos de uma escolha que traria uma maior probabilidade de que o aprovado tivesse notável saber jurídico. Tal concurso também traria maior transparência sobre o processo de escolha, seria um incentivo a que nossas melhores cabeças jurídicas almejassem uma vaga no STF, e diminuiria a suspeição sobre o candidato aprovado. O sujeito estaria lá com base estritamente em seu mérito e teria menor probabilidade de sofrer pressões políticas uma vez empossado do cargo. Este cenário, contudo, tem chance quase nula de acontecer. O estabelecimento de um concurso público substitutivo da nomeação presidencial e aprovação parlamentar seria uma redução de poder de tais políticos, e político nenhum gosta de ter seu poder diminuído. A mudança exigiria pressão popular, mas é improvável que a população se coordene em torno de tal proposta.
Uma vez que escolhas técnicas estão descartadas, devemos perguntar: Pode-se esperar que um indicado não tenha ideologia? Todos temos, em maior ou menor grau, um conjunto de valores estabelecidos, uma concepção normativa do mundo e uma ideia do que pode e do que não pode ser feito para transformar o que é no que gostaríamos que fosse. Um nomeado para o STF que não cause ojeriza nos partidos e na imprensa com sua ideologia deve ou ser alguém moderado no espectro ideológico, e, portanto, uma pessoa com uma ideologia ou então uma pessoa que nunca expressou uma opinião ou atuou politicamente. Alguém acredita mesmo que o presidente e o senado aprovariam alguém para o STF sem ter qualquer informação sobre o que essa pessoa pensa da vida política do país?
O ato de composição do STF é muito importante, precisa ser vigiado e deveria sofrer alguma reforma. Mas as instituições que vamos criar precisam trabalhar com uma ontologia que não assuma indivíduos que não existem e com uma metodologia que nos dê regras práticas em vez de palavras no vácuo. De outra maneira, continuaremos com quimeras legislativas e um processo no qual o controle político da mais alta corte judicial do país fica muito afastado da população.