“De todas as concepções da mente humana, dos unicórnios às gárgulas à bomba de hidrogênio, a mais fantástica talvez seja o buraco negro: um buraco no espaço com uma margem definida dentro da qual qualquer coisa pode cair e fora da qual nada pode escapar, um buraco com uma força gravitacional tão forte que mesmo a luz é capturada e mantida em seu poder, um buraco que dobra o espaço e distorce o tempo.” Assim o físico Kip Thorne descreveu esse ícone cultural celebrizado como uma metáfora para toda perda irreversível, toda voragem irrefreável, o desespero que aniquila. Ironicamente os buracos negros não são nem buracos nem negros. São estrelas colapsadas, incapazes de resistir à própria gravidade que concentra toda a sua matéria num ponto de volume zero e densidade infinita no qual espaço e tempo são aniquilados. Envoltos em geral num nimbo luminoso que define as margens de sua atração irreversível, o chamado “horizonte de eventos”, ante eles Stephen Hawking disse que se poderia glosar o que Dante leu às portas do Inferno: ‘Abandonai toda esperança, oh vós que entrais’.”
Por outro lado, assim como o poeta entrou sem abandonar a esperança até o fundo do inferno para emergir ao pé da montanha do Purgatório sob o céu estrelado, lá em cima os inumeráveis buracos negros concentram suficientes mistérios para que não só fantasistas mas cientistas possam fantasiar cientificamente sobre suas potências criativas. As evidências mostram que esses fantasmas de estrelas estão intimamente associados a muitas propriedades e processos do universo, como a gravidade, a evolução estelar e os efeitos do tempo no espaço e vice-versa. “A gravidade opressiva [de buracos negros supermassivos] pode ter disparado condensações que eventualmente levaram às rodas majestosas das galáxias em espiral tal como a Via Láctea” (F. Melia). “Dentro de cada buraco negro que colapsa” disse o cosmólogo Martin Rees, “podem estar as sementes de um novo universo em expansão.” E segundo Carl Sagan “buracos negros podem ser aberturas para outro lugar. Se mergulhássemos dentro de um buraco negro, conjectura-se que reemergiríamos em uma parte diferente do universo e em outra época no tempo … Buracos negros podem ser entradas para Países das Maravilhas. Mas haverá Alices ou Coelhos brancos?”
O próprio Stephen Hawking reviu suas ideias e não surpreende – ou não surpreenderia se não tivesse vivido na carne a aniquilação do desespero até a raiz dos ossos – que no fim da vida tenha dito sobre esses monstros cósmicos: “Os buracos negros não são tão negros como os pintam. Não são as prisões eternas que outrora se pensava … as coisas podem sair de um buraco negro tanto para fora quanto possivelmente em outro universo. Assim, se você sente que está num buraco negro, não desista – há uma saída.”
Convidados
Daniel Vanzella: professor do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo e co-autor de Buracos Negros: Rompendo os limites da ficção.
George Matsas: professor do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista, Titular da Academia de Ciências do Estado de São Paulo e co-autor de Buracos Negros.
Rodrigo Nemmen: professor de Astrofísica da Universidade de São Paulo e pesquisador associado do Goddard Space Flight Center da NASA.