Édipo

Entrevista com Adriane Duarte, Flávio de Oliveira e Lúcia Rocha.

Em mais uma edição especial da série Café Filosófico, o Estado da Arte leva ao ar uma discussão sobre a tragédia de Édipo, Rei de Tebas, com Adriane Duarte, professora de letras clássicas da Universidade de São Paulo e autora de Cenas de reconhecimento na poesia gregaFlávio de Oliveira, coordenador do Centro de Estudos Clássicos da Universidade de Campinas e tradutor do Rei ÉdipoLúcia Rocha, professora de Filosofia Antiga da Federal de São Paulo e autora de Édipo Rei, a vontade humana e os desígnios divinos na tragédia de Sófocles.

Durante o ano de 2017, o Café Filosófico se dedicou, através de uma série de ciclos mensais de palestras, a discutir o arco de temas em torno à “Responsabilidade”. Assim o ano se abriu com o ciclo Novos Horizontes da Responsabilidade, que, entre outros, contou com o filósofo e psicanalista Zeljko Loparic contrapondo a Ética da Lei de Lacan e Freud e a Ética do Cuidado de Winicott. Naturalmente, numa discussão dessa ordem, o Complexo de Édipo era um tópico inevitável. Para Freud

O destino de Édipo nos move somente porque poderia ter sido o nosso – porque o oráculo declarou a mesma maldição sobre nós, tal como sobre ele, antes do nosso nascimento. É o destino de todos nós, talvez, dirigir nosso primeiro impulso à nossa mãe e nosso primeiro ódio e nosso primeiro impulso assassino contra nosso pai.

Mas, como tudo o mais em torno à lenda de Édipo, essa interpretação tão bem implantada no imaginário popular é largamente controversa. Mesmo um psicanalista relativamente ortodoxo como Erich Fromm sugeria objeções:

Se a interpretação de Freud está correta, deveríamos esperar que o mito nos contasse que Édipo encontrou Jocasta sem saber que ela era sua mãe, se apaixonou por ela, e então matou seu pai, mais uma vez inconscientemente. Mas não há indicação nenhuma no mito de que Édipo se sinta atraído ou se apaixone por Jocasta.

Independentemente da interpretação psicanalítica, contudo, não há dúvida de que o destino de Édipo nos move porque poderia ter sido o nosso. Não que pudéssemos esperar sermos envolvidos em uma trama tão horrenda quanto à do incesto e do parricídio involuntários de Édipo, mas, como diz a professora Rocha, “pode ser que estejamos fazendo algo, querendo fazer uma coisa e estejamos fazendo exatamente o seu contrário”. Por isso Édipo se tornou um paradigma imortal do sofrimento involuntário e da culpa inconsciente – algo que, em teoria, é uma contradição em termos, mas que, na prática, é um enigma que devora a todos nós. Afinal, em que medida os nossos sofrimentos são causados por nossas transgressões? Em que medida essas transgressões são voluntárias, e em que medida eram inexoráveis? E em que medida nosso destino é determinado pelas transgressões de nossos antecedentes?

É nessa condição fecunda dos grandes paradigmas humanos que faz com que a tragédia de Édipo possa se relacionar de maneira prismática a tantos dos Ciclos já promovidos pelo Café Filosófico, como por exemplo O sofrimento humano nos tempos atuais (2014), Encarando a dor (2013), Família (2012) ou Mitos (2009). 

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