Poesia em Casa: César Vallejo

O poeta e tradutor Pedro Gonzaga apresenta ao leitor do Estado da Arte a poesia luminosa de César Vallejo, escritor peruano.

por Pedro Gonzaga

A poesia hispânica, mesmo quando vinda do novo mundo, encontra, nas primeiras décadas do século XX, uma luminosidade, uma capacidade de registrar a força do sol, do campo, da natureza, que só encontra par na poesia chinesa clássica. Não é difícil observar isso em Vallejo, como também não em Jorge Guillén, ou mesmo em Llorca. É como se houvesse uma nitidez extraordinária em cada elemento, em cada cenário, produzindo imagens de imorredouros verões dentro da mente do leitor. Que esse calor irradie nossa precária semana.

O poeta peruano César Vallejo (Divulgação)

“Verão”

Verão, já me vou. E me dão pena
as mãos submissas e pequenas de tuas tardes.
Chegas devotadamente; chegas velho;
E já não encontrarás ninguém em minha alma.

Verão! E passarás por minhas sacadas
com grande rosário de ametistas e ouros,
como um bispo triste que chegasse
de longe a buscar e bendizer
os anéis rotos de uns noivos mortos.

Verão, já me vou. Lá, em setembro
tenho uma rosa de que muito te encarrego;
haverás de regá-la com água benta todos
os dias de pecado e de sepulcro.

Se à força de chorar o mausoléu,
com luz de fé seu mármore alteia,
levanta ao alto teu responso, e pede
a Deus que siga para sempre morta.
Tudo há de ser já tarde;
e tu não encontrarás ninguém em minha alma.

Já não chores, Verão! Naquele sulco
Morre uma rosa que renasce muito…

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