por Pedro Gonzaga
A poesia hispânica, mesmo quando vinda do novo mundo, encontra, nas primeiras décadas do século XX, uma luminosidade, uma capacidade de registrar a força do sol, do campo, da natureza, que só encontra par na poesia chinesa clássica. Não é difícil observar isso em Vallejo, como também não em Jorge Guillén, ou mesmo em Llorca. É como se houvesse uma nitidez extraordinária em cada elemento, em cada cenário, produzindo imagens de imorredouros verões dentro da mente do leitor. Que esse calor irradie nossa precária semana.
“Verão”
Verão, já me vou. E me dão pena
as mãos submissas e pequenas de tuas tardes.
Chegas devotadamente; chegas velho;
E já não encontrarás ninguém em minha alma.
Verão! E passarás por minhas sacadas
com grande rosário de ametistas e ouros,
como um bispo triste que chegasse
de longe a buscar e bendizer
os anéis rotos de uns noivos mortos.
Verão, já me vou. Lá, em setembro
tenho uma rosa de que muito te encarrego;
haverás de regá-la com água benta todos
os dias de pecado e de sepulcro.
Se à força de chorar o mausoléu,
com luz de fé seu mármore alteia,
levanta ao alto teu responso, e pede
a Deus que siga para sempre morta.
Tudo há de ser já tarde;
e tu não encontrarás ninguém em minha alma.
Já não chores, Verão! Naquele sulco
Morre uma rosa que renasce muito…