por Leandro Oliveira
O maestro Victor Hugo Toro, de 43 anos, nasceu em Santiago do Chile e realizou seus estudos de regência de orquestra na Faculdade de Artes da Universidade do Chile. Foi vencedor do II Concurso Internacional de Regência Orquestral – Prêmio OSESP – Organizado pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e foi regente principal da Orquestra Sinfônica do SODRE, no Uruguai.
Desde 2011 é diretor artístico e regente titular da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas. Os quase dez anos a frente da orquestra garantiram uma estabilidade importante para a formação, que passou um pouco à deriva com vários chefes diferentes ao longo da década anterior. Nesta temporada 2019, a OSMC comemora seus 90 anos – e suas atividades oficiais têm início nos dias 15 e 16 de março, com a versão em concerto da ópera “Cavalleria Rusticana”, de Pietro Mascagni (1863 – 1945).
É como líder de uma das mais antigas orquestra do Brasil, da cidade do maior compositor brasileiro do século XX, Antonio Carlos Gomes, que Victor Hugo Toro fala para o Estado da Arte.
Após oito anos à frente da Orquestra Sinfônica de Campinas, qual são suas conquistas e frustrações?
Victor Hugo Toro – Não sei se posso chamar isso uma conquista, mas fico feliz pelo próprio fato de ter sido diretor artístico e regente titular desta orquestra por oito anos e ainda ter um bom e respeitoso relacionamento com o grupo. O habitual no mundo sinfônico latino-americano é que os maestros e as orquestras tenham um relacionamento difícil com poucos anos de trabalho conjunto, mesmo que o grande público nem sempre fique sabendo disso.
No meu trabalho com a OSMC existe obviamente um desgaste natural, mas sinto que após oito anos e muitas lutas, ainda podemos trabalhar profissionalmente, nos entendemos mutuamente e conseguimos fazer boa música.
A orquestra ainda é muito marcada publicamente – para bem e para mal – pela figura do maestro Benito Juarez (que comandou a formação por 25 anos)
Victor Hugo Toro – Outra conquista destes anos é ter recolocado a OSMC no mapa das importantes orquestras brasileiras. Na verdade, ela sempre tem sido uma agrupação importante, mas após a saída do Benito Juarez em 2001 se passaram 10 anos – e o grupo teve 7 maestros diferentes!
Isso naturalmente fez a orquestra perder um perfil, uma imagem definida e um projeto de trabalho continuo. Nestes 8 anos a orquestra voltou a ter uma atividade constante e de bom nível, uma cara reconhecível, um planejamento geral o mais profissional possível, voltou a estabelecer um permanente trabalho com maestros e solistas convidados, a gravar Cd´s, a se apresentar na sala são Paulo e no festival de Campos do Jordão, retomou sua tradição de concertos ao ar livre e, e isto me alegra muito, voltou-se a falar bem dela no meio sinfônico brasileiro.
Mas não falamos das frustrações…
Victor Hugo Toro – Pelo lado das frustrações, lamento que a orquestra ainda não tenha conseguido ter uma sede própria, que seja de uso exclusivo do grupo – isso esperamos que seja solucionado pronto com a iminente reforma do centro de convivência cultural de Campinas. Também o fato de não ter conseguido montar uma sólida estrutura de marketing e captação de recursos, com dedicação exclusiva, que permita oficializar maiores e melhores parcerias, fazer gestão de marketing, captação, patrocínio, doações e apoios para viabilizar os projetos da OSMC.
Administrativamente, qual a real situação da OSMC?
Victor Hugo Toro – Neste momento ela está com 74 vagas preenchidas de forma ativa. Os integrantes da orquestra são funcionários da prefeitura e para entrar no quadro de músicos da OSMC é necessário fazer concurso público. A orquestra realiza a maior parte das suas atividades (principalmente ensaios e algumas das apresentações em temporada) no Teatro Castro Mendes, na vila industrial em Campinas.
Realizamos uma media de 60 apresentações por ano, entre temporada sinfônica, concertos didáticos, apresentações em igrejas, espetáculos ao ar livre, homenagens a Carlos Gomes, eventos especiais, etc. Cerca de 2/3 das nossas apresentações anuais são gratuitas.
O orçamento da orquestra está em cerca de 12 milhões de reais anuais – suficiente, imagino, para o salário dos músicos – mas surpreendente para a quantidade de eventos anuais da temporada. Como foi ao longo deste período a relação da OSMC ao poder público e à comunidade campineira?
Victor Hugo Toro – Eu tenho percebido o envolvimento sincero da Prefeitura Municipal de Campinas na manutenção da orquestra assim como o esforço e dedicação dos músicos em fazer o maior e melhor trabalho possível. A Orquestra Sinfônica é mantida pela Prefeitura Municipal de Campinas, através da Secretaria de Cultura e, de longe, é o mais importante aparato artístico da região e a maior estrutura cultural de todo o interior paulista. Segundo a lei municipal de Campinas, a Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas deveria ter 119 integrantes.
A OSMC tem um relacionamento emocional com a cidade de Campinas que muitas orquestras gostariam de ter com as suas cidades. Uma parcela importante da cidade se sente orgulhosa da “sua” orquestra. Mas o envolvimento da iniciativa privada da cidade e da região com a orquestra é bem menor do que eu gostaria. Eu gostaria que esse envolvimento com a sociedade civil e a inciativa privada fosse cada vez maior, que a orquestra não fosse vista por alguns como um gasto, mas como um investimento fundamental na sociedade; que fosse entendido que, quanto maior sejam nossos recursos e apoios, maiores são as nossas possibilidades de atender a uma parcela maior da população e trazer maiores benefícios culturais, sociais e artísticos para todos os cidadãos.
As últimas temporadas contaram, proporcionalmente, com muita música brasileira – qual sua impressão sobre essa produção junto aos ouvintes?
Victor Hugo Toro – A música brasileira é um dos pilares fundamentais das nossas programações anuais. Por objetivo auto imposto, pelo menos 25% do nosso repertório é música brasileira, seja estreias de novas peças, resgate de obras, participação em festivais de música contemporânea, repertório sinfônico tradicional, apresentação de obras de Carlos Gomes, concertos com música popular brasileira, etc.
Pessoalmente, sinto que é uma das maiores e mais especiais responsabilidades que a orquestra pode ter. Dar espaço a produção sinfônica nacional foi historicamente sempre uma preocupação importante para a OSMC, eu diria quase uma questão de honra, e é impressionante a quantidade de primeiras audições de repertório que a orquestra apresentou ao longo dos anos. O público da orquestra entende muito bem isso. Em geral recebem atenta e respeitosamente as obras brasileiras que programamos e isso nos permite manter uma importante porta aberta que define muito a pessoalidade própria da Sinfônica.
Este ano a OSMC comemora 90 anos – e figura, certamente, entre as mais antigas orquestras brasileiras em atividade. Quais os planos para a Temporada 2019?
Victor Hugo Toro – Estamos trabalhando para fazer uma temporada de 90 anos inesquecível. Queremos uma grande festa, que durará a temporada completa, onde a OSMC reafirme a sua importância no cenário regional e nacional. Queremos olhar para o passado, para tudo o que tem sido construído nestes noventa anos, e assim pensar e imaginar o que pode ser o futuro, redefinir o espaço da OSMC na sociedade atual, fazê-la cada vez mais atuante e viva.
Em 2019 construiremos um acervo histórico da OSMC, faremos exposições que vão contar a história da formação, realizaremos sentidas e emotivas homenagens a pessoas e instituições que tem ajudado a escrever esta bela história de 90 anos, com apresentações para todas as parcelas da população. Realizaremos concertos especiais com antigos músicos da sinfônica, além de um concurso de composição em homenagem aos 90 anos da orquestra.
Eu quero que seja uma temporada muito especial, de celebração do aniversário da nobre senhora de 90 anos, mas cheia de energia e vitalidade, como é a OSMC.