Gasolina no incêndio fluminense

O Ministro da Justiça, Torquato Jardim, acirrou os ânimos da disputa política no Rio de Janeiro.
Centrais sindicais entre outras categorias realizam um protesto na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), nesta sexta-feira, 28, contra as reformas da Previdência e trabalhista em discussão na Câmara e propostas pelo presidente Michel Temer. Na foto, confronto entre policiais e manifestantes na Cinelandia. FOTO: MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO

por Gabriel Heller

Desde seu ingresso no Ministério do Presidente Michel Temer, na pasta da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União, o Ministro Torquato Jardim proporciona manchetes à imprensa. Nomeado em maio para o Ministério da Justiça, órgão particularmente relevante em tempos de Lava Jato e crise na segurança pública, era de se esperar que suas entrevistas fossem mais do que peças informativas.

Na semana passada, o Ministro concretizou as expectativas ao declarar, em suma, que o Governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e seu Secretário de Segurança, Roberto Sá, não controlam a Polícia Militar (PM) do Estado; que os comandantes de batalhão da PM são sócios do crime organizado, em esquema que envolve a Assembleia Legislativa (Alerj); e que as milícias controlam as favelas do Rio.

A classe política do Rio de Janeiro e a PM reagiram enfurecidas às entrevistas do titular da Justiça. A palavra mais utilizada para qualificá-las foi “irresponsabilidade”. A Presidente da Comissão de Segurança Pública da Alerj e o Governador solicitaram nomes dos envolvidos e evidências das acusações. Pezão inclusive interpelou judicialmente o Ministro para que prove por meio de documentos o que afirmara, sob pena de incorrer em calúnia ou difamação.

O deputado federal Alessandro Molon, de oposição aos Governos Federal e Estadual, surfando na desgraça alheia, protocolou representação no Ministério Público Estadual para que fosse investigada a ligação de políticos com o crime organizado.

Depois de pressionado por todos os lados, o Ministro da Justiça disse que expressara uma opinião pessoal, não do Governo Temer. Convenhamos, é no mínimo imprudente um Ministro de Estado dar declarações públicas sobre matéria relacionada à sua pasta e pretender que elas sejam lidas como meras opiniões pessoais. Fica ainda pior quando se lembra que a Polícia Federal está subordinada a Torquato Jardim.

Surgem os justos questionamentos: o Ministro estava falando no modo “papo de bar”, fã do filme Tropa de Elite? Ou estava revelando resultados de operações em curso? Tem evidências do declarado ou apenas indícios?
Como surpreendentemente tem sido recorrente em Brasília, os comentários mais ponderados a respeito do assunto vieram do Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Destacando que os fatos apontados possivelmente correspondem à realidade, Maia criticou a generalização a respeito da PM e, mais importante, lembrou que as declarações seriam normais se tivessem ocorrido após uma operação, com apresentação de seus resultados. Mais grave: é válido supor que a entrevista do Ministro da Justiça pôs em risco investigações ainda não finalizadas.

Mostra-se também pertinente questionar como se darão as relações entre as forças de segurança federais e estaduais depois desse entrevero político. Como fica a confiança necessária para troca de informações e atuação conjunta? Ou o Governo Federal não pretende contar com a PM do Rio em suas operações na região?

O despreparo das lideranças na área de segurança não é novidade no Governo Temer. Em setembro, o Ministro da Defesa antecipou à imprensa o efetivo que seria enviado para cercar a Rocinha e tentar pôr fim ao caos reinante. Não à toa, os principais criminosos fugiram.

O único alívio é saber que o comando das operações conjuntas envolvendo os Ministérios da Justiça e da Defesa e o Gabinete de Segurança Institucional vem cabendo ao chefe deste último, Ministro Sérgio Etchegoyen, único do trio com o conhecimento técnico e a continência verbal imprescindíveis ao exercício da função.

As reações fluminenses às entrevistas de Torquato Jardim são mero teatro político que redundará em nada importante para sanear o verdadeiro problema: o caos na segurança pública do Rio de Janeiro, cuja fonte inclui – todos o sabem – a corrupção de agentes públicos – policiais e não policiais. Ninguém em sã consciência divulgará nomes e informações sobre as relações de comandantes da PM com o crime organizado – se é que o Ministro da Justiça dispõe desses dados.

O que todos devem fazer agora é engolir seu orgulho, parar de perder tempo com cortinas de fumaça e pôr mãos à obra. A grave e triste situação do Rio de Janeiro demanda autoridades mais preocupadas com seu trabalho e com a segurança dos cidadãos.

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