Nuccio Ordine: A guerra de Bolsonaro contra a “inútil” cultura humanística

Em texto para o jornal italiano Corriere della Sera, o filósofo e professor Nuccio Ordine escreveu sobre os ataques de Jair Bolsonaro às humanidades.

por Nuccio Ordine

Há poucos dias, um tweet do presidente do Brasil repercutiu no mundo inteiro em poucas horas. Com o tom triunfalesco de um miles gloriosus (soldado fanfarão), Jair Bolsonaro anunciava que estava apoiando a transferência de recursos das faculdades de filosofia e sociologia para as de “veterinária, engenharia e medicina”, visando favorecer “um retorno imediato para o contribuinte”.

De acordo com o seu Ministro da Educação, Abraham Weintraub, o político ex-paraquedista acrescentava, numa segunda mensagem, que “o papel do governo é o de respeitar o dinheiro dos contribuintes” e de “ensinar a ler, a escrever e a contar” tendo em vista “um trabalho que gera renda para a pessoa, bem-estar para sua família e que melhora, por sua vez, a sociedade”. Um conjunto impressionante de banalidades e lugares comuns, que já são difundidos (em silêncio) em vários países do mundo. É trágico que exatamente no Brasil (onde diversos presidentes foram incriminados e condenados por corrupção!) a receita para proteger o dinheiro dos contribuintes seja a de fechar as faculdades “inúteis” (porque não geram lucro). Um fármaco que (além de criar estudantes que se inscrevem nas universidades com o único objetivo de ganhar e não para nutrir uma paixão) acabará por se revelar, como confirma sua raiz etimológica, um veneno em vez de um remédio.

Não se combate a corrupção abolindo os estudos humanísticos e com a ilusão de que o dinheiro possa ser a única bússola para orientar a humanidade. O culto ao dinheiro e o desprezo pelos saberes injustamente considerados “inúteis” (como a literatura, a filosofia, a arte, a música, a pesquisa científica de base) desertificam o espírito e toda forma de ética e solidariedade humana. Em vez disso, favorecem o desenvolvimento de regimes nos quais o elogio da ditadura militar e das armas, a apologia da pena de morte, o desprezo pelos gays, o desrespeito pelos direitos das mulheres, o racismo e a xenofobia encontram um terreno ideal para o cultivo.

Tradução de Luiz Carlos Bombassaro. Publicado com autorização do autor.
Originalmente em Corriere della Sera.

COMPARTILHE: