“Na beira do rio haviam comido o papagaio, que não sabia falar. Necessidade. Fabiano também não sabia falar”. “Se temos a palavra ‘bom’, para que precisamos de ‘mau’? Cada palavra contém em si o contrário.” Partindo de Vidas Secas e 1984 — de Graciliano e Orwell —, um ensaio do jornalista Elton Frederick sobre a deturpação da linguagem, sobre a degradação de nossos compromissos semânticos. Sobre a necessidade de escrevermos em tábuas estreitas.
"Numa democracia liberal, a mídia cumpre o fundamental papel de intermediação dos diferentes setores da sociedade. A imprensa é nossa ágora moderna. Como tal, demanda exigências mínimas de decoro." Para Mano Ferreira, "a declaração pública do colunista Helio Schwartsman, na Folha de S. Paulo, de que torce pela morte do presidente Jair Bolsonaro, cruzou uma nova fronteira na degradação do debate brasileiro" — e essa degradação, em última análise, piora a democracia.
"Os mecanismos para driblar a autocondenação vão desde santificar a ação por nobres propósitos ideológicos, políticos e sociais a eufemismos: uma linguagem que produz uma névoa semântica para esterilizar os atos violentos e contornar a culpabilidade." Um ensaio de Celina Alcântara Brod sobre a força do rótulo no desengajamento que foge à responsabilidade moral individual. "Nosso mal-estar da política, está, e não é de hoje, nessa constante fabricação de um inimigo sem rosto."
Em plena Segunda Guerra, quando o governo britânico pedia aos seus cidadãos imensos sacrifícios económicos, Orwell ficou chocado com a incongruência de jornais em que os editorialistas davam voz aos pedidos do governo, ao mesmo tempo que publicavam anúncios de casacos de peles, na mesma página. Esta imagem ilustra um problema de fundo que poucas pessoas parecem compreender: o do financiamento da cultura, da ciência, das artes, da filosofia e da informação.
"Destruíram-se estátuas de Lênin — mas a subversão mais sutil e eficaz está no deboche corrosivo dos grafiteiros que transformaram os operários e camponeses robustos nos velhos monumentos comunistas das praças de Sófia, na Bulgária, em super-heróis de quadrinhos, com tinta e spray. Churchill daria um belo Pinguim." O que fazer com as estátuas da época colonial? Para Rodrigo de Lemos, que elas prestem testemunho àquilo que escolhermos.
As considerações do músico Wynton Marsalis sobre mais um assassinato público e sem sentido de um Cidadão Negro por agentes da lei nos EUA, na tradução de Leandro Oliveira.
Um ensaio de Gilberto Morbach sobre Albert Camus e a verdadeira peste: consentir o absurdo, a mais radical derrota humana.
"Não foram 31.199 mortes 'e daí?' Não foram 31.199 mortes porque 'é o destino de todo mundo'." Não nos esqueçamos, "recusando a mentira, rejeitando a malícia, rechaçando a covardia e restaurando o vínculo entre palavra e realidade". O ensaio de Eduardo Wolf sobre o fascista familiar e nossos 30 mil mortos.
"Na pior das ironias, a revolta contra o sistema, ao menos até agora, tornou o sistema algo mais assustador do que nunca." Depois de George Floyd, uma nação em busca de justiça. Por Hugh Eakin, para a New York Review of Books. Tradução de Gilberto Morbach.